sexta-feira, 3 de abril de 2009
Trauma
Vinte e cinco reais é muito caro para uma Jornada. Estudante de Medicina de um estado tão ao sul da terra natal, tantos gastos. Com comida, principalmente. Confesso: bebida vem em segundo plano. Livros fotocopiados ocupam uma pequeníssima parcela em meu gráfico de pizzas mental. Costumo justificar a diminuta parcela por ser ilegal a pirataria. Então é uma válvula de escape para meu sentimento de culpa.
Ainda assim fiz a inscrição, prometendo descontar a quantia em comida para emagrecer, ou em bebida para ficar sóbrio. Depois de um pequeno simulado de 30 questões sobre o abordado pela Liga do Trauma da faculdade, a simulação. Um estrondo. A sirene. Murmúrios de que algo realmente acontecera no pátio da faculdade. Era só a simulação, confirmei para mim mesmo, não esperando nada demais.
Desci ao lado dela para ver o ocorrido. Tanta gente me faz lembrar que tenho Peoplefobia. Recupero-me e sigo escada abaixo. Corpos espalhados ao chão. Omentos, rádios, ulnas, estômagos, plexos braquiais e outros termos anatômicos foram tão visíveis naquele momento. Uma interjeição de admiração pela descoberta oculta todas as aulas de anatomia dos períodos anteriores. Gente gritando. Flashes fotográficos. Alguns mais tímidos arriscavam fotos em celulares VGA.
No momento em que o Corpo de Bombeiros retalhou um carro ao meio para retirar supostas vítimas lá de dentro, alguém ao meu lado diz:
-“Muito massa isso tudo. Quero fazer parte da Liga. Vou fazer de tudo para entrar”.
Vi tanta admiração pela organização naquelas palavras. Mais que isso, pela Medicina. E eu que não sentira nada. Fui apenas o narrador onisciente dos sentimentos alheios. Desejei ser mero observador.
Não sei ainda o quê, mas algo não me despertou. Tomara que eu não tenha afinidade pelo Trauma, porque se eu tiver que deixar a Medicina...
Mas ganhei um ingresso para a festa que não iria, na noite seguinte. Não havia escada abaixo para me recuperar da Peoplefobia.
E os 25 reais não foram descontados em comida, tampouco bebida.
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As reticências poderiam ter sido melhor explicadas, pra não deixar o gostinho da dúvida na gente. O melhor foi o paralelo entre economizar dinheiro, comer e beber. Mais uma coisa que fazemos sem nos dar conta e você, com habilidade, nos faz concordar que é assim.
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