sexta-feira, 3 de abril de 2009
Dividindo o egoísmo 1
Esta semana foi muito difícil pra mim. Recebi a notícia de que minhas férias estavam apenas no início do segundo tempo, praticamente. Remanejamento de funcionários da faculdade, mais um mês de férias, e conversas de futura greve me deixaram bastante zangado. O que inventar para fazer em casa? Passar caderno a limpo, estudar Microbiologia, ouvir as aulas de Embriologia que faltei de corpo presente com o pensamento no Pancho. Saco, saco, saco! E só me vinham assuntos estudantis em mente. Faltas de originalidade. Dinheiro limitado porque o salário do meu pai atrasara... Enfim, sem muitas alternativas.
Em outras semanas eu tinha moto. Tudo bem, não era minha, mas meu irmão a deixava comigo. Assim não precisava agüentar as reclamações ao pedir emprestada a da minha irmã. No entanto, justamente na semana em que recebi a notícia de que iria voltar à minha cidade só-Deus-sabe-quando, meu irmão não deixou a moto comigo. Não sei por que, não me interessa esse saber. Só fiquei imaginando se eu a deixei sem gasolina, ou se estraguei alguma peça. Mas não, não fiz nada de errado. Apesar de qualquer ação ser motivo para reclamações.
E os dias se seguiram. Eu, a pé, de um lado para outro. Merda! Justamente nessa semana, a dentista marca dolorosas sessões de canal todos os dias. Eu disse TODOS OS DIAS! E não é perto da minha casa seu consultório. É longe, muito longe para quem está, há 23 anos, fora de forma. Saio suado de casa, chego pregado na dentista. E ela é tão linda... Como eu queria estar cheiroso. Mas é casada.
E tantas dores no dente, que se irradiavam para o ouvido mesmo após anestesia local. Eu fingia que não sabia o porquê da irradiação. Fingia não saber anatomia pra ter um álibi para reclamações. Às vezes é tão bom as pessoas ficarem com dó da gente. Se elas têm moto, podem emprestar para “aliviar” o sofrimento da vida. Mas minha irmã não. Ela tem moto, mas lhe falta sensibilidade para perceber o sofrimento do próximo. Ou lhe sobra a ponto de perceber o fingimento. Dúvida!
Ela tem filho na pior idade. Sabe aqueles anos em que já sabe falar de tudo sem saber o significado do mesmo tudo? Pois é. E fala palavrões sem saber que são palavrões. Alguém o acha bonitinho falando tantas palavras. Acreditam ser ingênuo. Pode ser mesmo, desde que ela tivesse me emprestado a moto.
Para ir ao serviço, vai de moto. Para levar o filho à escola que é, de fato, longe, leva-o de moto. Para ir a casa distante do namorado, vai de moto. Ou seja, ela tem tudo na vida. Já tem um filho, tem namorado, tem emprego, tem salário, tem dívidas e tem uma moto, que ela mesma pagou, com dinheiro dela, suado. Mas não sei, algo me diz que ela deveria ter me emprestado a moto. Eu suo para ir à dentista e nem por isso deixo de ir a pé.
Nunca vi isto. Ela comprou a moto, pagou a moto, tem filho que precisa da moto. Tem serviço que precisa da moto. É muito individualismo e materialismo para uma só pessoa. E eu juro, juro de pé junto, que estava disposto a repartir esse egoísmo com ela.
Vou pedir à dentista uma anestesia geral, assim não sentirei as pernas ao caminhar tanto.
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Ótimo.
ResponderExcluir